Homem não chora! Essa máxima antiga já não faz sentido, porque chorar é algo próprio do ser humano, independente de sexo ou idade. Além do mais, chorar não significa apenas uma demonstração de tristeza. Chora-se também de felicidade, de alegria. E choro é a denominação de um ritmo musical legitimamente brasileiro, assim como o frevo pernambucano. Que se saiba, não há em outra parte do mundo ritmos similares a esses dois, salvo se, por conta da globalização, haja alguém os executando, o que não seria nada demais, assim como aqui se toca mambo, jazz, reggae, salsa e tantos outros ritmos que não são nossos.
Em Feira de Santana, o chorinho melodioso e "balançado" é bem representado pelo grupo "Chorinho Entre Amigos", que comemora cerca de três décadas de atividade, com três CDs gravados e muitas apresentações, não só aqui como em várias outras cidades. O grupo surgiu de forma natural no antigo bar do violonista Didi (João Dias), onde se reuniam amigos para "brincar", alguns tocando violão, cavaquinho e bandolim, outros fazendo ritmo com garrafas vazias, caixas de fósforo, tamborete ou o que encontrassem.
A chegada de Mirinho (Almir Ferreira Silva), profissional educado e atencioso, que tocava diversos instrumentos e já havia participado de grupos musicais e trios elétricos, foi fundamental para a primeira formação dos chorões, que passaram a se apresentar no bar de Didi, atraindo um público seleto e numeroso aos sábados e domingos.
O grupo também perdeu a excelente vocalista Marriete, mas agora conta com a eclética cantora Ericka, em substituição. O Chorinho Entre Amigos está assim formado: Didi (violão), Laerte (violão 7 cordas/cavaquinho), Carlos (bandolim), Felipe (pandeiro), Luciano (rebolo), Douglas (tan-tan) e Ericka (vocalista). O repertório, além de músicas autorais, reúne o fino do choro, como: Pedacinhos do Céu, Brasileirinho, André de Sapato Novo, Zero a Zero e outros.
O improviso e a competição são características próprias do chorinho, fazendo com que cada instrumentista extraia de si o máximo, mostrando toda a sua habilidade e técnica. O choro teria surgido de forma natural e espontânea, quando músicos que tocavam composições vindas da Europa, como marchas e polcas, achando-as "duras", começaram a dar uma “amolecida”, criando um ritmo absolutamente diferente: solto, amaciado, dengoso ou choroso, um “choro alegre”.
Essa nova linguagem musical começou a tomar conta dos salões de bailes do Rio de Janeiro e seguiu pelo Brasil. Dois violões, um de sete cordas para “frasear”, o outro para segurar a harmonia dentro das tonalidades médias, cavaquinho e flauta para os solos, ou um bandolim, são fundamentais. Há grupos que introduzem saxofone, trompete, reco-reco, prato e faca (objetos de uso doméstico) e outros instrumentos, como sanfona, mas o básico é indispensável.
Pixinguinha, autor de Carinhoso, é considerado o “pai” do chorinho. Nascido em 1897, aos 13 anos ele já tocava na Orquestra do Teatro Rio Branco, no Rio de Janeiro, com provável influência do ambiente da Pensão Vianna, pertencente a seu pai, que era flautista e reunia amigos para tocar na pensão. Jacob do Bandolim, Garoto (Aníbal Augusto Sardinha), Valdir Azevedo, Russo do Pandeiro, Izaías Bruno, Canhoto, Mário Beltrame, Jotagê Alves, Capinha, Dilermando Reis, dentre outros, fazem parte do primeiro time do chorinho.
Garoto, autor da música Gente Humilde, tocou violão para o presidente Roosevelt, dos Estados Unidos, na Casa Branca, algo raro de acontecer, e impressionou os respeitados maestros Duke Ellington e Art Tatum. Chamado nos Estados Unidos de “o homem dos dedos de ouro”, Garoto foi um dos mais importantes “chorões” brasileiros e considerado, na época, o melhor violonista do Brasil.
Por: Zadir Marques Porto
Fotos: Washington Nery
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